COBRAR IPVA PARA JATINHOS E IATES SERIA BOM PARA O BRASIL?
Carro, moto, caminhão e ônibus pagam todo ano
o IPVA (Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores). Mas por que o
imposto não é cobrado de outros veículos como jatinhos e iates?
O tema entrou no noticiário após o pré-candidato à
presidência pelo PSOL, Guilherme Boulos, defender publicamente a cobrança do IPVA
aos proprietários de tais veículos. Porém, essa exigência daria certo por aqui?
Faz sentido cobrar de quem tem mais, dizem analistas
A ideia de cobrar um imposto sobre a propriedade de aviões
executivos e embarcações seria interessante do ponto de vista fiscal, segundo
especialistas consultados pelo UOL.
Para eles, o imposto para esses veículos estaria baseado no
princípio da capacidade contributiva. Indivíduos com mais dinheiro podem pagar
mais impostos. Por isso a ampliação do IPVA seria um modo de combater a
desigualdade tributária que afeta o país.
"É uma questão de política fiscal e de como aplicar
mais justiça no nosso sistema tributário. Dentre o ônus e bônus da tributação,
o governo também deve levar em consideração a justiça fiscal", disse
Tathiane Piscitelli, professora da FGV e especialista em direito tributário e
financeiro.
Bens de luxo
As formas de cobrança e mesmo quais tipos de aeronaves e
barcos seriam tributados podem variar e, assim, também seus impactos. Mas, de
forma geral, como é um tributo sobre a posse de bens de luxo e de alto valor,
as consequências negativas seriam minimizadas.
O mercado em geral, portanto, pouco sentiria uma alíquota
cobrada sobre o valor venal de cada veículo. Dessa forma, não haveria uma
oneração excessiva da cadeia produtiva, eliminando os impactos negativos sobre
o negócio.
Além disso, a chamada 'bitributação', quando dois impostos
incidem sobre a mesma mercadoria ou serviço, que poderia preocupar, também é
descartada já que o IPVA é um imposto sobre posse.
"Quem compra uma Ferrari, por exemplo, não está preocupado
com o quanto de IPVA terá de pagar. Jatos e iates são produtos de luxo, e isso
[o imposto] afetaria apenas o bolso dos mais poderosos", afirmou Murilo
Torelli, professor de ciências contábeis do Mackenzie.
Não deveria afetar pequenos proprietários
Mas, para que o imposto funcione de maneira correta, são
necessários ajustes para que o Estado não onere pequenos proprietários.
"O ponto de discussão são fatores operacionais, como
identificar o local de residência do proprietário, por exemplo. Mas, a rigor, não
teria nenhum problema em cobrar esse tipo de tributo", afirmou Bernard
Appy, economista e diretor do Centro de Cidadania Fiscal.
Assim, antes de instituir a cobrança, o governo deveria
identificar proprietários, estudar quais os setores seriam deixados de fora (os
de transporte, por exemplo) e criar uma estrutura destinada à cobrança, para só
então iniciar a tributação.
Quanto o governo poderia arrecadar?
Cálculos feitos pelo Sindifisco Nacional (Sindicato Nacional
dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil) para o UOL mostram
que o país poderia arrecadar cerca de R$ 4,7 bilhões por ano a mais com a
ampliação do tributo.
O cálculo previsto é baseado em uma alíquota única de 4% do
valor venal dos veículos, não envolvendo barcos ou aviões comerciais. Ao todo,
foram listados 1.682 helicópteros, 641 aviões a jato e 827 turboélices, além de
cerca de 168 mil embarcações de esporte e lazer.
O IPVA como um todo arrecadou, no ano passado, cerca de R$
40 bilhões. Ou seja, o novo tributo poderia incrementar em cerca de 10% a
arrecadação destinada a estados e municípios.
Cobrança já foi rejeitada pelo STF
A Constituição prevê a cobrança de impostos sobre a
"propriedade de veículos automotores". O problema é que um
entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal) de 2007 recusou a cobrança do
IPVA sobre aviões e embarcações.
A decisão considerou a cobrança incabível, pois o IPVA
sucedeu a antiga Taxa Rodoviária Única, que historicamente excluiu a posse de
embarcações e aeronaves.
O antigo tributo, entretanto, era destinado ao antigo
Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER) e usado basicamente na
manutenção das estradas brasileiras.
Como um jato ou iate, que eram poucos à época da lei, não
utilizam uma via que precisa de manutenção nos mesmos moldes das estradas, eles
ficaram de fora da cobrança.
Atualmente, porém, o dinheiro arrecadado com o IPVA é
dividido entre o estado e o município onde o veículo foi licenciado e,
normalmente, é destinado para a manutenção de vias públicas, mas também à
compra de remédios, construção de escolas, entre outras ações.
Com o entendimento do STF, a solução do governo poderia
estar na criação de um novo tributo nos moldes do IPVA, mas voltado apenas a
aeronaves da aviação executiva e grandes embarcações não-comerciais.
"A saída seria criar um imposto próprio para essas
propriedades que, de fato, não são tributadas. Poderia prever uma isenção das
embarcações de pequeno porte para pesca, por exemplo, mas essas grandes
embarcações devem ser tributadas", afirmou Tathiane Piscitelli, da FGV.