AS ESTREPOLIAS DE EDUARDO MALVADEZA

O tempo fechou no último final de semana entre os deputados Eduardo Bolsonaro (suspenso do PSL-SP) e Julian Lemos (PSL-PB), vice-presidente nacional do partido pelo qual o presidente Bolsonaro elegeu-se presidente da República e o 03 tornou-se o deputado federal mais bem votado da história do País, com 1,8 milhão de votos. A troca de ataques começou com Eduardo humilhando Julian, que é uma espécie de tesoureiro do PSL e principal aliado do deputado Luciano Bivar, presidente nacional da legenda: ambos romperam com o presidente e seus familiares, o que levou-os a deixarem o partido e tentarem criar o Aliança pelo Brasil, que não saiu do papel. Dudu malvadeza, como é conhecido no PSL de oposição aos Bolsonaros, disse que Julian era “pau de arara, favelado e traíra”. 

Tudo porque Julian é paraibano e a família presidencial não prezaria muito quem nasce nesse estado. Julian ficou ofendido. “Sabe qual problema de um ladrão arrogante? É achar que um nordestino como eu tem medo de algo ou de alguém. Pela minha honra eu não tenho limites. Ela é a única coisa que eu tenho. Em setembro eu avisei. Não mexe comigo”, foi como Julian reagiu aos ataques de Eduardo. Mas, logo na sequência, o parlamentar paraibano começou a metralhar o filho do presidente, numa profusão de mensagens no Twitter, de corar de vergonha o mais pacato cidadão. 

A maioria das mensagens traz acusações gravíssimas a Eduardo, a quem Julian chama de “demagogo, ladrão e hipócrita”. Mas o dirigente nacional do PSL não fica só em revides inconsequentes. O mais grave são as denúncias de que o filho do presidente usou recursos milionários do fundo partidário (dinheiro público) para financiar atividades particulares de uma entidade em defesa de interesses conservadores (CPAC) e também verbas do auxílio-moradia e auxílio-mudança da Câmara, recebidos irregularmente, para dar de entrada na compra de um apartamento.

Dinheiro público

Em entrevista à ISTOÉ, Julian Lemos diz que enquanto Eduardo Bolsonaro era o presidente da legenda pesselista de São Paulo, no ano passado, ele desviou recursos do milionário fundo partidário do partido. Eduardo gastou, de forma irregular, em agosto de 2019, o valor de R$ 600 mil para pagar as contas do evento “Cúpula Conservadora das Américas”, promovida pela Conferência de Ação Política Conservadora (CPAC), da qual o filho 03 é líder no Brasil (a entidade tem origem nos Estados Unidos, mas Eduardo assumiu a tarefa de promovê-la na América Latina). 

O evento, que nada tinha a ver com o PSL, foi realizado em um hotel de luxo em Foz do Iguaçu, e todas as despesas foram pagas pelo fundo partidário. “Como eu posso provar? É só você ir às contas do PSL no TSE. Está tudo lá, as notas fiscais, toda a documentação”, frisa Julian. Mas esse não foi o único evento da CPAC, um organismo privado, que o PSL bancou com dinheiro público. 

O partido de Bivar pagou a conta também da primeira reunião mundial da CPAC. Vários ministros de Bolsonaro, como Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e Damares Alves (Direitos Humanos), estiveram presentes na conferência, realizada no Hotel Transamérica, na capital paulista, nos dias 11 e 12 de outubro de 2019. 

O astrólogo Olavo de Carvalho participou do ato por teleconferência. “O Eduardo é corrupto. Andava de Fiat Uno e agora anda com carro blindado, com motorista. O sonho dele é ser presidente da República”, acrescenta Julian, que faz questão de dizer que não quer simplesmente acusar a família do presidente de malfeitos. “Eu não sou a Joice (deputada Joice Hasselmann) e nem o Bebianno (ex-ministro Gustavo Bebianno, morto recentemente de um ataque cardíaco). Eu falo as coisas porque sei como elas aconteceram. 

Segundo Julian, Eduardo comprou um apartamento, no Rio, usando R$ 216 mil que recebe como auxílio-moradia mensalmente, para dar de entrada no imóvel, embora tenha apartamento funcional em Brasília, razão pela qual não precisaria receber a ajuda de custo de R$ 4.253 mensais. Eduardo usou também outros R$ 30 mil que recebeu como auxílio-mudança do Rio para Brasília logo que assumiu o mandato no início de 2019. Eduardo já tinha apartamento funcional em Brasília e não teria direito a receber a ajuda para mudar-se. 

No total, de acordo com Julian, o filho do presidente utilizou R$ 246 mil recebidos irregularmente da Câmara para complementar a compra do imóvel. “Esse deputado ladrão, falso moralista e liberal de araque adora um auxílio-mudança mesmo morando em Brasília. É esse tipo de gente que gosta de atacar os outros: 216+30: 246 mil”, publicou Julian no seu twitter no final de semana passado. E, em outra mensagem, ele complementou: “Receber auxílio-moradia e pôr no bolso quando deveria alugar um imóvel é roubo? Falo de R$ 216 mil. Esse dinheiro foi usado para dar entrada na compra de um apartamento. A pior coisa que pode existir é um demagogo, ladrão e hipócrita na política. Ladrão, me deixa quieto”, pediu o vice-presidente do PSL. E o que Eduardo respondeu sobre os tuítes, perguntou ISTOÉ a Julian. “Ele ficou caladinho. Ele sabe que comigo o buraco e mais embaixo”, disse Julian. O deputado chega a filosofar sobre as razões que o levaram a disparar contra os familiares do presidente. “Eles estão colhendo as tempestades que semearam”.

Rachadinhas com a advogada

Julian Lemos confirma, também, o que a ISTOÉ havia publicado em novembro do ano passado, de que a advogada Karina Kufa, aliada de Eduardo, foi introduzida pelo 03 no PSL paulista para coordenar uma série de ações que lesariam os cofres do partido, com o objetivo de promoverem uma divisão dos recursos entre eles. “Rachadinhas? Sim, muitas!”, diz o deputado no Twitter. 

Em entrevista à ISTOÉ, ele detalhou como o esquema funcionava. Eduardo contratou Karina Kufa para elaborar a política de compliance do PSL, e ela tentou emplacar contratos em valores de R$ 500 mil e de R$ 1 milhão. Segundo Lemos, Kufa e Eduardo dividiriam o dinheiro, mas os contratos foram barrados por ele e por Luciano Bivar, o presidente nacional do partido. No Twitter, Julian diz que Eduardo “é surfistinha, maconheiro e descarado!”. Julian afirma ainda que o filho do presidente é conhecido na Câmara por viajar com frequência, inclusive aos Estados Unidos, mesmo em viagens particulares, mas sempre recebendo diárias de R$ 2 mil, as quais os parlamentares têm direito a receber em viagens oficiais. “Até as viagens que ele faz para surfar no Hawaí são pagas pela Câmara”, resume Julian. Mas ele desconhece os valores recebidos irregularmente. “Eu não sei quanto ele já recebeu indevidamente, mas basta fazer um levantamento no Portal da Transparência: todas as diárias recebidas estão lá”.

Uma outra coisa que irritou Julian foi a malvadeza de Eduardo no ataque aos parlamentares considerados inimigos de seu pai. Foi por meio da página Bolsofeios, que Eduardo mantém clandestinamente na Internet, que Julian recebeu inúmeras provocações, sobretudo as que o chamaram de “pau de arara” e que motivaram a sua revolta. O Bolsofeios, como o deputado lembra, é operado nas redes sociais, especialmente Instagram, Facebook e Twitter, por Eduardo Guimarães, chefe de gabinete de Eduardo. Em quebra de sigilo determinada pela CPMI das Fake News, com autorização judicial, os parlamentares descobriram que essa conta falsa era comandada a partir do IP de um computador do gabinete do 03. Além das investidas contra Julian, o Bolsofeios promove constantes agressões a Joice Hasselmann (PSL-S), ex-líder do governo no Congresso, mas que também rompeu com os Bolsonaros. Essa conta fake costuma se referir à deputada como “pepa” e recorrentemente publíca memes de Joice com o uso de imagens de mulheres com gordura mórbida. Mas, como Julian já havia avisado antes, ele realmente não está para brincadeiras: lembrou que no passado usou R$ 35 mil de recursos do fundo partidário do PSL para pagar custas processuais de advogados do presidente Jair Bolsonaro. “Quando eu paguei mais de R$ 35 mil de custas processuais do seu pai, eu era o melhor homem do mundo, não era? Veremos quem é pau de arara, favelado e traíra. Sou eu?” A história está apenas no começo. Eduardo ainda terá muita dor de cabeça com os ex-aliados. Eles sabem demais.

Esclarecimentos do deputado Julian Lemos (PSL-PB) 

O deputado Julian Lemos (PSL-PB) esclarece que ele nunca foi tesoureiro do PSL e que não pagou R$ 35 mil de custas processuais de advogados de Jair Bolsonaro usando dinheiro do fundo partidário, mas do seu próprio bolso. “Eu paguei os advogados de Jair usando minhas economias pessoas, assim como o Bebianno que gastou mais de R$ 80 mil”. Juliano Lemos diz também não ter dito que Eduardo Bolsonaro desviou quase R$ 2 milhões do PSL para financiar dois eventos da CPAC, a sua OGN política. Na verdade, segundo ele, o filho do presidente usou dinheiro da fundação do partido para bancar um encontro da CPAC em Foz do Iguaçu, no qual gastou R$ 600 mil, e outro em São Paulo, que gastou R$ 1,1 milhão. Sobre os contratos de compliance de R$ 500 mil e R$ 1 milhão que a advogada Karina Kufa queria introduzir no partido, e que seriam alvo de rachadinhas com Eduardo, Julian esclarece que esses contratos “não foram cancelados por mim e por Bivar, pois eles apenas não foram feitos”.

ISTOÉ