UM FILHO COM MEDO, MAS CHEIO DE CORAGEM: HENRIQUE RELEMBRA DITADURA MILITAR
O ex-deputado federal e ex-presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves, avaliou como “uma das noites mais tristes da história do Congresso Nacional” os acontecimentos que marcaram esta semana em Brasília, especialmente a noite e madrugada entre quarta-feira (06) e quinta-feira (07). Em conversa com o Diário do RN, ele criticou a radicalização, defendeu o respeito ao resultado das urnas e destacou a importância da imprensa livre, afirmando que “a democracia vai vencer tudo isso”.
As declarações acontecem no ápice de uma crise que tomou conta do Legislativo entre terça e quinta-feira. Na terça (5), o Congresso foi palco de um protesto de parlamentares bolsonaristas que, com fitas adesivas sobre a boca, acusaram censura e cerceamento da liberdade de expressão. No mesmo dia, a pauta do plenário foi tomada por debates acalorados e tentativas de acelerar projetos de interesse político do bolsonarismo. Na quarta (6) e na madrugada desta quinta (7), o clima se agravou. Sessões prolongadas durante a noite e manobras regimentais expuseram uma disputa de poder entre Câmara e Senado, com parlamentares assumindo temporariamente funções das mesas diretoras.
“Eu estive lá por 44 anos. Onze mandatos. Fui presidente da Câmara. Fui líder de bancada por sete anos seguidos, vice-líder por 12. Vivi a ditadura com muito aprendizado. E quando vejo a Câmara de ontem, aquele espetáculo deles sentarem à mesa, atravessarem a noite, usurparem o poder do presidente do Senado, do presidente da Câmara… Que casa do povo brasileiro é esta?
Que parlamento é este? Eu pensei que era para discutir segurança nacional, a isenção do imposto de renda até cinco salários mínimos, a crise climática, mas não, é uma coisa insana e absurda! ”, pontua Henrique.
O ex-deputado disse nunca ter enfrentado algo semelhante quando comandou a Casa, lembrando apenas de um incidente com a invasão de indígenas, resolvido com interrupção da sessão e diálogo. Para ele, o momento é grave e marcado pela “polarização e radicalização” de ambos os lados.
“Critico os dois extremos. A esquerda precisa reconhecer que não ganhou sozinha. Foi ao segundo turno com muita dificuldade, e quem decidiu foi o centro democrático, que optou pela democracia. O povo brasileiro não quer isso, quer paz, quer respeito”, afirmou.
O pedido de impeachment do ministro Alexandre de Moraes, que é uma das exigências da oposição, é considerado por Alves como uma articulação apenas para satisfazer setores radicais e mobilizar a militância da extrema direita. No entanto, não deverá ser concretizado.
“Pode ter 41, 51 ou 81 assinaturas, Davi Alcolumbre não vai pautar. Essa extrema direita quer o impeachment de Moraes, tirar Lula, derrubar ministros, anistia plena, geral e irrestrita como se o país não tivesse leis! ”, observa.
Henrique também rechaçou a anistia ampla aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro, outro projeto motivador da pressão dos bolsonaristas no movimento deflagrado nesta semana. Henrique concorda que os processos que estão em curso seguem os trâmites democráticos e defende a postura de Alexandre de Moraes.
“[Pedir anistia] É uma violência à lei. Já há processos em curso, provas registradas, direito de defesa garantido. Não dá para simplesmente zerar tudo. O Brasil não pode perder sua seriedade perante o mundo, sua Constituição, sua tradição. Não é possível vivermos isso. Falam muito do Alexandre de Moraes, mas cada um deveria pensar: se não fosse ele, será que hoje não teríamos uma ditadura militar? Todo mundo sabe que houve tentativa de golpe, que começou entre 15 e 20 de dezembro. Dois militares não aceitaram, o plano recuou. Iria vir o golpe, o 8 de janeiro foi o desabafo, o desespero”, analisa.
O ex-presidente da Câmara avaliou ainda o papel dos atuais líderes do Legislativo, dizendo que Hugo Motta “está cercado de pressão, mas como nordestino, vai se safar”, e que Davi Alcolumbre é mais experiente e “trata com mais tranquilidade” a crise.
José Agripino
Durante conversa com o Diário do RN, Henrique fez elogios a declarações do ex-senador José Agripino Maia, seu adversário histórico.
“É inegável o talento político, a inteligência e a experiência humana do ex-senador José Agripino. Fui aprendendo a compreender, com temperança e fraternidade. Ele e Garibaldi fazem falta no cenário federal. O que ele estaria fazendo hoje no Congresso, articulando, costurando, construindo. Mas não temos mais os Agripinos nem os Garibaldis no Congresso Nacional”, lamenta, relembrando também o primo e outrora aliado Garibaldi Alves Filho (MDB), ex-senador e ex-governador.
Ele se refere à fala do ex-senador publicada no Diário do RN nesta quinta-feira (07). Segundo Agripino, ‘não tem ditadura no Brasil, há um conflito de poderes que se respeitam. Pelo contrário, o Poder Judiciário tem a sua posição e é respeitada, o Poder Legislativo tem a sua posição, está com conflitos internos e é respeitado, e o Executivo também. A democracia do Brasil está pleníssima”.
Rogério Marinho
Questionado sobre a postura do senador Rogério Marinho (PL), líder da oposição no Senado, e um dos principais agitadores da mobilização pelo impeachment de Alexandre de Moraes, pela anistia e pela PEC do foro privilegiado, Henrique não se referiu diretamente a ele. Entretanto, em tom de lamento, relembrou a postura do avô de Marinho, e a disputa saudável contra Aluízio Alves.
“Djalma Marinho, uma pessoa tão respeitável… Meu pai foi candidato a governador contra ele, um encontro respeitado, profundamente respeitado, não se fazia uma crítica, uma disputa limpa, correta, voto a voto. Foi adversário do meu pai, Aluízio, e eu o enfrentei politicamente depois. Mas sempre com respeito”, relembra.
Reiterando que é preciso respeitar o resultado das eleições, Henrique relembra seu pai, Aluízio Alves e Ullysses Guimarães: “Temos que aceitar as derrotas e aprender com elas. Quem viveu a ditadura, mesmo à distância, precisa deixar claro: ditadura nunca mais. Temos que ter ódio e nojo da ditadura”.
Por Carol Ribeiro