PRODUTORES ALERTAM PARA COLAPSO NO DIBA COM POSSÍVEL ASSENTAMENTO DO MST
A decisão do Governo do Rio Grande do Norte de finalizar o edital para selecionar agricultores familiares — incluindo integrantes do MST — reacendeu o debate sobre a ocupação de áreas no Distrito Irrigado do Baixo Açu (Diba). O anúncio ocorreu um dia após cerca de 300 manifestantes bloquearem a RN-118 em cobrança pelo repasse de 3,5 mil hectares. Entidades do agronegócio alertam para riscos de aumento de custos, perda de competitividade, retração de investimentos e possível comprometimento do único distrito irrigado do estado.
Para a Federação da Agricultura do RN (Faern), um assentamento dentro do perímetro irrigado ameaça o equilíbrio do sistema. O presidente da entidade, José Vieira, afirma que o Diba depende do rateio entre produtores para manter operação, manutenção e bombeamento — estrutura que seria diretamente afetada. “O Diba é o único distrito de irrigação em pleno funcionamento no RN, sustentado por produtores que rateiam custos. A entrada de um assentamento do MST alteraria essa equação”, disse.
Ele acrescenta que a possibilidade de conflito fundiário já freia investimentos. “Produtores e empresas instaladas no Diba já manifestam preocupação concreta. Muitos trabalham com contratos de exportação, operações de alto custo e prazos rígidos de entrega. Qualquer sinal de instabilidade impacta diretamente planejamento e expansão”, afirmou. Vieira destaca que a agricultura irrigada demanda “assistência contínua, tecnologia e capital de giro” e avalia que pequenas glebas improdutivas podem “comprometer toda a estrutura coletiva”. A Faern afirma ter discutido o tema com o Governo, mas considera que “a decisão ignora aspectos técnicos fundamentais”.
A Federação estuda recorrer à Justiça com o objetivo de impedir que o distrito seja utilizado como área de assentamento. “Nosso entendimento é que o Diba foi estruturado com finalidade específica e não pode ser utilizado para ações de caráter político. A medida adequada é a suspensão do edital e a revisão completa da decisão”, diz Vieira. Segundo ele, produtores já revisam planos de expansão. “A simples possibilidade de um assentamento dentro do distrito traz um fator de risco que compromete a confiança de quem mantém a fruticultura irrigada do Vale do Açu ativa”, completa.
O presidente do Diba, Michel Cosme, reforça a preocupação. Ele afirma que a mudança no perfil dos usuários elevaria custos e afetaria pequenos irrigantes. “Vai comprometer toda a administração aqui do projeto. Isso vai acrescentar por demais os custos”, afirma. Para ele, o cenário gera “muita apreensão e muita angústia”, com risco de esvaziamento gradual do distrito. “Somos 130 produtores, dos quais 110 têm 8 hectares que pagam R$ 2.500 e vai ser crescido mais de 30% só pelo fornecimento da água, fora outras despesas de custo de produção. De repente os custos inviabilizam e vão saindo até que o projeto simplesmente se acabe”, alerta.
Cosme diz ainda que o modelo defendido pelo movimento não se sustentaria. Ele afirma que as áreas que o MST está reivindicando corresponde a 400 hectares que deveriam ser licitadas para produtores da região. “Esse pessoal está querendo dividir quatro hectares para cada família, o que inviabiliza a sustentabilidade deles e prejudica a sustentabilidade do projeto também. Simplesmente um sem-terra não teria condições de sustentar a família e pagar o fornecedor”, conclui.
Governo nega repasse direto ao MST
O secretário estadual de Agricultura, Guilherme Saldanha, rebateu a interpretação de que o edital em preparação destina áreas diretamente ao MST. Segundo ele, o processo será aberto a qualquer agricultor familiar que atenda aos critérios. “Não existe uma área específica no Baixo Açu que vai ser entregue ao MST. É uma informação equivocada. Existe um edital destinado à agricultura familiar, que pode contemplar integrantes do movimento sem nenhum problema, desde que ele se adeque às exigências”, afirmou.
Saldanha disse que o governo atua amparado juridicamente e que a Procuradoria-Geral do Estado validou os procedimentos. “Não tenho dúvida da competência e da seriedade do corpo jurídico da Procuradoria Geral do Estado, dentro do qual esse processo passará e já passou.”
O secretário também lembrou que o Estado ampliou a segurança jurídica dos produtores ao entregar escrituras definitivas e ao recuperar a segunda etapa do projeto em 2023. “O governo está preocupado sim e foi efetivamente quem deu condições do perímetro Baixo Açu ser implantado em sua integralidade.”
Sobre o edital, Saldanha afirma que ele está “nos finalmentes” e deve ser publicado ainda neste mês. “Os critérios são especificamente voltados para agricultores familiares. Existe um processo de seleção, obviamente, cumprindo as legislações pertinentes ao caso. Não pode ter destinação específica para A, B ou C.” Quanto às críticas de representantes do agro e da possibilidade da Faern judicializar o edital, o secretário afirmou que não tem conhecimento do teor das reclamações, nem do real motivo que leve a uma possível judicialização visto que é uma prerrogativa discricionária do governo do Estado realizar processos licitatórios para o projeto Baixo Açu.
