PRESIDENTE DO IBGE DEIXA O CARGO NESTA 6ª FEIRA


A presidente do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), Susana Cordeiro Guerra, afirmou que deixa o órgão nesta 6ª feira (9.abr.2021). O anúncio foi feito por meio de uma carta enviada aos colegas. Seu sucessor ainda não foi escolhido.

Susana pediu demissão da presidência do IBGE em 26 de março. Segundo o órgão, a decisão foi por motivos pessoais e de família. Em nota divulgada na época, o IBGE havia dito que ela seguiria no “cargo até a transição para o novo presidente a ser indicado”.

Em sua carta de despedida, obtida pelo G1, Susana falou sobre seu trabalho à frente do IBGE ao longo dos 2 anos que esteve no instituto. Indicada diretamente pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, ela assumiu o cargo em fevereiro de 2019.

“Tenho a convicção de que conseguimos lançar bases sólidas para que a operação censitária seja implementada. O próximo Censo terá, como lastro, o aprendizado e os avanços técnicos viabilizados nos últimos meses, mas também se apoiará na expertise e na experiência construídas pelos ibgeanos ao longo de décadas”, escreveu.

O pedido de demissão de Susana ocorreu 1 dia depois de o Congresso cortar substancialmente o orçamento do Censo 2021, estudo que pretende coletar dados detalhados sobre a população. Deveria ter sido feito em 2020, mas foi adiado por causa da pandemia.

O IBGE esperava ter R$ 2 bilhões para a pesquisa. Mas o relatório do Orçamento, elaborado pelo senador Márcio Bittar (MDB-AC), reduziu o valor para R$ 71 milhões (3,5% que foi estabelecido pelo governo). A diferença foi destinada para obras indicadas por congressistas.

Susana chamou o IBGE de “uma verdadeira joia no serviço público brasileiro” da qual todos os brasileiros devem se orgulhar.

“Os talentosos e dedicados ibgeanos honraram a tradição de 85 anos de excelência do Instituto, superando barreiras e gerando as mais produtivas soluções. Apesar da pandemia, podemos enaltecer o fato de que, nos últimos 13 meses, o IBGE manteve toda sua produção estatística, sem nenhuma interrupção.”

Susana é especialista em reforma do Estado, descentralização e fortalecimento da capacidade organizacional do setor público do Banco Mundial, onde trabalhou com governos na Ásia, África, e América Latina.

Eis a íntegra da carta:

“Estimados ibegeanos,

No dia 26 de março de 2021, com muito pesar, anunciei que, por motivos pessoais e familiares, deixarei o cargo de presidente do IBGE. Meu último dia oficial à frente do Instituto será sexta-feira, 9 de abril.

Nos últimos dois anos, servir nesta função tem sido uma honra extraordinária, tanto pessoal quanto profissionalmente. Com espírito de gratidão, gostaria de compartilhar minha avaliação sobre as conquistas alcançadas pelo IBGE nestes tempos tão desafiadores, não sem antes congratular a todos pelo trabalho e engajamento, cuja excelência é marca registrada do corpo técnico do IBGE.

Como todos sabem, o IBGE – e o país – enfrentaram desafios significativos nos últimos dois anos. Cheguei à Presidência do instituto a apenas 17 meses do início do Censo Demográfico 2020, nosso maior e mais complexo projeto institucional. Contudo, fomos todos surpreendidos pelo advento de uma pandemia que alterou nosso planejamento inicial e nos impôs uma série de desafios, dentre eles repensar a forma como coletamos os dados e formular instrumentos inovadores para mensurar o impacto da pandemia na economia e na sociedade brasileira.

Devo dizer que estou muito orgulhosa de como o IBGE se posicionou para enfrentar esse desafio sem precedentes. Os talentosos e dedicados ibgeanos honraram a tradição de 85 anos de excelência do Instituto, superando barreiras e gerando as mais produtivas soluções. Apesar da pandemia, podemos enaltecer o fato de que, nos últimos 13 meses, o IBGE manteve toda sua produção estatística, sem nenhuma interrupção.

Para alcançar esse resultado, nos ancoramos estrategicamente em seis linhas principais de ação, que envolveram tanto o impulsionamento de processos já em andamento na casa quanto a realização de esforços disruptivos, com o objetivo de acelerar o processo de modernização do IBGE, em especial no que tange à coleta de dados.

A primeira linha de ação estruturante foi a migração imediata de cerca de 10.000 funcionários para uma plataforma de trabalho remota, uma escala nunca antes experimentada pela instituição. Em um período de cinco semanas, concluímos a transição para o modelo de trabalho remoto, alicerçado em fluxos e processos de trabalho automatizados, implantação da assinatura eletrônica e adesão ao SEI.

Segundo, e concomitante, impulsionamos o uso e a absorção de novas tecnologias e ferramentas no uso, processamento e análise de dados. Buscamos potencializar o uso de ferramentas tecnológicas na coleta de dados e, ao mesmo tempo, intensificar o uso de registros administrativos nas pesquisas regulares. Ferramentas e recursos como webscraping, big data e pareamento de bases de dados são grandes exemplos de áreas em que foram verificados significativos avanços para manutenção da produção estatística e geocientífica na pandemia.

Nesse contexto, a parceria firmada com a Receita Federal, com apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento, foi um marco histórico na agenda do uso de registros administrativos do país. As parcerias também firmadas com o Ministério da Saúde, Ministério da Cidadania e Ministério da Justiça, entre outras, são emblemáticas desse avanço, de forma significativa, no papel do IBGE como coordenador de fato do sistema estatístico nacional.

Terceiro, tornamos a comunicação interna mais fluida e frequente, fortalecendo nosso intercâmbio de informações durante a pandemia. Essa iniciativa foi fundamental para a integração das diferentes áreas do IBGE. Criamos novos fóruns virtuais (com uma média de 200 membros em cada estado quase toda semana), servindo como instâncias de intercâmbio em tempo real entre as diretorias e a rede de coleta. Essa iniciativa se mostrou uma ferramenta eficaz para curtos “loops” de feedback entre as equipes e identificação de oportunidades de melhoria, em meio às muitas adversidades que enfrentamos na coleta.

A quarta linha de ação envolveu a implementação das primeiras pesquisas de pulso na história do IBGE, que tinham como principal objetivo capturar, em tempo hábil, os impactos da pandemia na economia nacional. A PNAD COVID-19 acompanhou a evolução do mercado de trabalho e os impactos na saúde da população, com divulgações mensais e semanais. Já a pesquisa Pulso Empresa, com divulgação quinzenal, coletou informações sobre o desempenho das empresas nesse cenário de adversidade. Essas pesquisas se tornaram modelos internacionais, com reconhecimento de instituições multilaterais, e o convite inédito para que o IBGE, representando o Brasil, participasse do 8º Fórum Anual de Estatística do Fundo Monetário Internacional como palestrante, em um painel junto a outros países que enfrentaram, com sucesso, a geração de estatísticas durante a pandemia.

Na quinta linha de ação, enfrentamos o desafio de desenvolver e alavancar um modelo de capacitação à distância, com ações adaptativas e inovadoras na estratégia de capacitação organizacional e com a nossa Escola Nacional de Ciências Estatísticas, a ENCE, funcionando integralmente em plataforma virtual. Sob este modelo, milhares de funcionários foram treinados simultaneamente em um curto período de tempo, especialmente os profissionais que viriam a atuar nas pesquisas de pulso. Esta plataforma foi estruturante ao tornar viável a condução de todas as demais ações.

Por último, mas não menos importante, trabalhamos para melhorar a acessibilidade dos diferentes tipos de usuários – desde os formuladores de políticas até os cidadãos – às informações produzidas e coordenadas pelo IBGE. O Hotsite COVID-19 foi concebido com o propósito de centralizar todos os dados em produção relacionados à COVID, de forma a tornar a experiência do usuário mais interativa, principalmente por meio de painéis.

Pensando adiante, o IBGE precisará realizar o Censo Demográfico, operação que mais do que nunca será fundamental para o futuro do Brasil. O Censo funciona como uma plataforma de inteligência que viabiliza e aprimora a tomada de decisões de políticas públicas nos 5.570 municípios do país. A importância do Censo é reafirmada pelo próprio contexto de pandemia, que coloca ao país uma ampla gama de profundos desafios. O Censo é crítico nesse processo, uma vez que só ele será capaz de revelar, com precisão, essa realidade, subsidiando assim a tomada de decisões e a formulação de políticas públicas.

Tenho a convicção de que conseguimos lançar bases sólidas para que a operação censitária seja implementada. O próximo Censo terá, como lastro, o aprendizado e os avanços técnicos viabilizados nos últimos meses, mas também se apoiará na expertise e na experiência construídas pelos ibgeanos ao longo de décadas.

Podemos apontar três sólidos pilares para a realização do próximo Censo. O primeiro é que a operação contará com um modelo misto de coleta, incluindo entrevistas presenciais, telefônicas e online. O segundo pilar é a tecnologia de fronteira a ser aplicada na supervisão e no monitoramento, em tempo real, da operação censitária, fortalecendo a cobertura e a qualidade da operação como um todo. O terceiro pilar, a execução da operação, se baseará em um amplo “benchmarking” nacional e internacional, que inclui as melhores práticas de adoção de protocolos de saúde e segurança para coleta de dados, fornecendo diretrizes claras para os entrevistadores e entrevistados. Todos esses trabalhos já foram encaminhados através de nossa experiência recente e em acordos de cooperação técnica com outras instituições de ponta.

Gostaria de concluir esta carta agradecendo a todos os ibgeanos que, nesses últimos dois anos, dedicaram-se de forma extraordinária para que, juntos, pudéssemos enfrentar com técnica, profissionalismo, galhardia, e serenidade os desafios que nos foram impostos. O talento, o trabalho árduo e a resiliência dos ibgeanos foram e continuarão sendo fundamentais nesta trajetória. Foi um grande privilégio e uma grande honra ter servido a este Instituto singular. O IBGE é uma verdadeira joia no serviço público brasileiro, uma instituição da qual todos devemos nos orgulhar, como cidadãos brasileiros, a cada dia de nossas vidas.

Com profundo respeito e gratidão,

Susana Cordeiro Guerra

Presidente do IBGE”