COVID: UM ANO DA PRIMEIRA MORTE NO RIO GRANDE DO NORTE


A cadeira vazia na mesa de jantar, um lado vazio na cama, as roupas ainda no guarda-roupa, as fotos nos porta-retratos que antes decoravam e agora exalam saudade. Os bichos de estimação olhando para a porta esperando o retorno da antiga rotina de quem saiu sem se despedir. Eles não vão voltar. Desde o início de 2020, quando os primeiros casos de morte por Covid-19 apontaram no Brasil, todo fim de tarde alguém olha para o horizonte e espera um regresso. A primeira morte no País em decorrência do novo coronavírus foi em 12 de março de 2020, uma mulher de 57 anos. Após um ano, até a manhã desta sexta-feira (26), 303.880 pessoas foram levadas pela doença.

No Rio Grande do Norte, o primeiro óbito registrado foi em 28 de março de 2020. O professor do Departamento de Química da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN), Dr. Luiz Di Souza, com 61 anos. Ele deu entrada em um hospital privado no município de Mossoró no dia 21 de março de 2020. 

Fez o exame, que testou positivo, no dia no dia 27, indo a óbito no dia seguinte, 28. Foram 20 anos dedicados a educação e ao ensino superior. Dados do Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde (LAIS) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) apontam que já vivemos agora em março um cenário bem mais crítico do que o vivenciado no mês de junho do ano passado, quando se teve um pico do número de óbitos confirmados. 

Na época, o RN registrava 994 mortes por covid-19. Nesta sexta-feira (26), dois dias antes de um ano da primeira morte, o Estado somava 4.354 óbitos pela doença. Março dá sinal de que já é o mês - desde o início da pandemia no Rio Grande do Norte - com maior número de confirmações de óbito, considerando mortes em 24h e à quelas ocorridas em meses anteriores, mas só confirmadas neste mês. 

Trezentos e sessenta e cinco dias depois daquele março passado, mesmo com o início da campanha de vacinação, os hospitais seguem superlotados e alguns municípios estão começando a identificar falta de oxigênio para os pacientes internados. No País, se assiste novos recordes dia após dia. Em 24 de março, o Brasil atingiu a marca de mais de 3.000 mortes por Covid em 24 horas. 

O patamar foi o mais alto pelo 25º dia seguido. O luto Os acumulados de casos e boletins diários nos anestesiam para a realidade: Cada número divulgado era o amor da vida de alguém. Quem perde uma pessoa, precisa lidar com o emaranhado de sentimentos que ficam. 

Quem perde alguém para a Covid passa pelo luto pessoal em conjunto com o luto de um país inteiro. A psiquiatra Dayanna Barreto explica que o luto é um processo natural. Ele pode se manifestar pela morte, mas também pode estar relacionado a outras perdas – perda de emprego, por exemplo, realidade que ficou ainda maior com a pandemia de Covid, perda da rotina, perda do conhecido... O luto é justamente um mecanismo que a nossa mente usa para se adaptar a perda de algo muito importante. 

Algumas fases são conhecidas pela medicina: a negação, raiva, negociação, depressão e aceitação. Porém, isso não necessariamente indica que todas essas fases vão ser obrigatórias e que todo mundo irá passar por todas elas. Não existem receitas para superar o luto mas alguns cuidados podem ser tomados para melhor lidar com os sentimentos. “A melhor coisa a se fazer é acolher. Acolher esses sentimentos porque são sentimentos inconscientes que o nosso ego tem para se adaptar aquele momento. A prática da aceitação, do autocuidado, de tentar fazer coisas que tragam prazer... não encarar isso como uma traição daquela pessoa que se foi. 

Os momentos que foram vividos com aquelas pessoas permanecerão, mas as vidas do que ficam precisam seguir de alguma forma” explica Dayanna Barreto. Muitas famílias enlutadas perderam a chance do adeus. Isso porque a recomendação do Ministério da Saúde é de que velórios e funerais de pessoas que estavam infectadas não sejam realizados. “O processo de morte e sepultamento tem sido muito rápido. 

Não tem tido tempo das pessoas elaborarem esse processo” conta a Médica Psiquiatra. Nesse caso, Dayanna Barreto recomenda que os familiares possam descobrir algum ritual simbólico que ajude a facilitar a elaboração da perda. Além do vírus Mesmo quem não sofreu a morte de alguém próximo, também lida com oesgotamento causado pelos dias de isolamento e do cenário pandêmico. Um estudo feito pela Universidade de São Paulo (USP) mostrou que o Brasil lidera o número de casos de ansiedade e depressão durante a pandemia. 

A negligencia com o cuidado a saúde mental na rede pública de saúde, e as diferenças sociais de acesso a esse tipo de ajuda dificultam ainda mais esse quadro. Cuidar da saúde mental parece impossível mediante ao cenário atual. Porém, a Médica Psiquiatra Dayanna Barreto recomenda tentar priorizar pequenas coisas que nos trazem momentos de alegria para ajudar. “Tentar priorizar os pequenos elementos do nosso cotidiano que nos trazem algum momento de alegria. 

Tentar lembrar sempre que tudo na vida passa, de bom ou de ruim. Até lá a gente tem que tentar manter minimante uma qualidade de vida com o que é nos oferecido e com o que é possível fazer. Há momentos em que as situações ficam tão pesadas que há a necessidade de procurar ajuda (médica) e não há vergonha alguma em procurar ajuda”, orienta.