EMPRESÁRIO ENTREGA À CGU COMPROVANTES DE DEPÓSITOS EM CONTAS DE PARENTES DE PASTORES DO CASO MEC


A investigação sobre a corrupção no Ministério da Educação ganhou neste sábado (25) um novo personagem: um empresário entregou à Controladoria-Geral da União comprovantes de depósitos nas contas de parentes dos pastores suspeitos de participar do esquema de desvio de dinheiro público.

O tráfico de influência no Ministério da Educação tinha preço. Segundo o jornal Folha de S.Paulo, Wesley Costa de Jesus, genro do pastor Gilmar Santos, recebeu R$ 17 mil em negociação de evento com a presença do então ministro da Educação, Milton Ribeiro, no interior de São Paulo.

A TV Globo teve acesso ao comprovante de pagamento que o empresário José Edvaldo Brito entregou à Controladoria-Geral da União. Valor: R$ 17 mil no dia cinco de agosto de 2021. Depositante: Sime Prag do Brasil Ltda ME - uma empresa de dedetização.

Segundo Brito, quem fez o depósito foi um empresário amigo, Danilo Felipe Franco.

No mesmo dia, Danilo fez, em seu próprio nome, outros dois pagamentos: R$ 20 mil para Luciano de Freitas Musse, ex-assessor do MEC; e R$ 30 mil para Helder Diego da Silva Bartolomeu, genro do outro pastor, Arilton Moura. Edvaldo disse à CGU que pediu a Danilo fazer os depósitos.

O parecer do Ministério Público que serviu de base da operação contra os pastores e o ex-ministro menciona um relatório da CGU e cita: “Danilo Felipe Franco realizou três transferências bancárias a pessoas ligadas ao pastor Arilton Moura, totalizando R$ 67 mil.” Os três depósitos, para Wesley, Musse e Helder, somam R$ 67 mil. Segundo as investigações, o dinheiro fazia parte das tratativas.

O evento do ministro Milton Ribeiro com prefeitos da região de Nova Odessa aconteceu em 21 de agosto, 16 dias depois dos pagamentos. O evento foi organizado pelos pastores que estão sob investigação.

Segundo a Polícia Federal, o pastor Arilton Moura pediu R$ 100 mil ao empresário José Edvaldo Brito em troca da realização do evento em Odessa.

O empresário José Edvaldo Brito disse ao Jornal Nacional que fez os depósitos a pedido do pastor Arilton Moura. Segundo ele, os recursos seriam para ações filantrópicas.

Com autorização da Justiça, a PF gravou uma ligação de Arilton com uma advogada, na quarta-feira (22), dia em que ele, Gilmar Santos e Milton Ribeiro foram presos. O pastor ameaça “destruir todo mundo”.

Arilton: Eu preciso que você ligue para a minha esposa... acalme minha esposa... porque se der qualquer problema com a minha menininha, eu vou destruir todo mundo!

Não fica claro a quem Arilton estava se referindo quando falou em “menininha”.

A influência dos pastores no MEC ficou explícita em entrevista de 9 de abril do ano passado à TV Gazeta. O então ministro Milton Ribeiro foi a Goiânia exclusivamente para a entrevista com o pastor Gilmar Santos.

“Conforme nós anunciamos, está aqui conosco o ministro da Educação, Milton Ribeiro, a quem de antemão eu quero reconhecer a nossa dívida de gratidão pelo esforço e empenho que ele fez para atender o nosso convite para este bate-papo e para fazer uma exposição aqui das atuações de toda sua pasta”, disse Gilmar Santos.

Gilmar agradece ao colega Arilton Moura por coordenar a entrevista. Arilton estava nos bastidores do estúdio. Na abertura da entrevista, Milton Ribeiro diz que desmarcou sua agenda só para atender ao convite dos pastores.

Gilmar destaca sua atuação para estreitar o relacionamento de prefeitos e secretários de Educação com o ministro.

“A nossa pequeníssima cooperação em aproximá-los do ministro e da sua equipe técnica me deixou realizado por ver que eles saíram de lá com brilhos nos olhos, entendendo que há recursos à disposição para seus municípios na área da educação e eles dependiam só de orientações de como ter acesso”, diz Gilmar Santos.

A investigação da PF culminou na operação batizada de Acesso Pago, deflagrada na quarta-feira passada. Além de depoimentos e documentos, a PF juntou interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça. Em uma das conversas gravadas, o ex-ministro conta para filha que havia recebido uma ligação do presidente Jair Bolsonaro.

Milton Ribeiro: hoje o presidente me ligou... ele tá com um pressentimento, novamente, que eles podem querer atingi-lo através de mim, sabe? Ele acha que vão fazer uma busca e apreensão... Em casa... Sabe... É... É muito triste. Bom, isso pode acontecer, né?

Esse telefonema foi no dia 9 de junho, mesma data em que o presidente Bolsonaro estava com o ministro da Justiça, Anderson Torres, na Cúpula das Américas, em Los Angeles.

A oposição entende que a coincidência de datas das conversas que aparecem nas investigações da PF reforça a necessidade de apurar um segundo crime.

“A partir de agora não é somente o esquema de corrupção do Ministério da Educação, é a atuação do presidente da República para impedir a atuação da Polícia Federal fazendo uso de informações privilegiadas”, diz o senador Randolfe Rodrigues, da Rede-AP

O líder da oposição no Senado encaminhou o pedido para "apurar a conduta de violação de sigilo e de obstrução da Justiça do presidente Jair Bolsonaro” ao ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, que já conduz um inquérito sobre outra suposta interferência do presidente na PF.

O juiz Renato Borelli, responsável pela investigação do ex-ministro Milton Ribeiro, decidiu enviar o caso para o Supremo porque viu indícios de interferência do presidente, que tem foro privilegiado.

As investigações devem ficar com a ministra Cármen Lúcia, que já conduziu o inquérito sobre suspeitas de desvio de recursos do MEC, quando Milton Ribeiro era ministro.

Mesmo estando em um evento público, o presidente Jair Bolsonaro manteve neste sábado (25) o silêncio sobre o escândalo no MEC e sobre as denúncias de que interferiu nas investigações. Bolsonaro participou de uma marcha evangélica em Balneário Camboriú, em Santa Catarina.

O Ministério Público Federal afirma haver indícios de que a operação da PF vazou e de que Bolsonaro interferiu nas investigações.

O Palácio do Planalto e o Ministério da Justiça não se manifestaram. Na sexta-feira (24), o advogado de Bolsonaro, Frederick Wassef, disse que o presidente e o ex-ministro Milton Ribeiro não têm contato.

A defesa de Milton Ribeiro afirmou que a Polícia Federal e a Controladoria-Geral da União só levantaram dúvida sobre a conduta do ex-ministro por causa de um depósito na conta dele, que era o pagamento da venda de um carro, e a documentação será incluída no inquérito. A defesa também repetiu que, se havia menção a uma pessoa com foro privilegiado nos autos, o juiz de primeira instância não poderia ter analisado o caso.

A defesa de Arilton Moura informou que se manifestará nos autos.

A defesa de Luciano Musse disse que ele nunca praticou nenhuma irregularidade.

O Jornal Nacional não conseguiu contato com Wesley Costa de Jesus, Helder Diego da Silva Bartolomeu, Gilmar Santos e Danilo Felipe Franco.