PROPORÇÃO DE ADOLESCENTES ELEITORES AUMENTA PELA PRIMEIRA VEZ DESDE 2006
Aluna do colégio Renascença, localizado na Barra Funda, zona
oeste de São Paulo, Milena Altman Charatz vai votar pela primeira nas eleições
gerais de outubro. Aos 17 anos, seu voto é facultativo. Ir às urnas não é obrigatório
para analfabetos, menores de idade com mais de 16 anos e idosos acima dos
70.
Charatz faz parte de uma estatística animadora. Em 2018, a
proporção de jovens de 16 e 17 anos que tiraram título de eleitor para o pleito geral teve
a primeira alta desde 2006.
Segundo dados analisados pela Folha a partir de
números divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)
e pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral), 29,5% desta faixa etária está
alistada para votar em outubro. Isso corresponde a 250 mil novos eleitores. Em
2014, na eleição que reelegeu
a petista Dilma Rousseff, essa porcentagem era de 23,9%.
"Pelo rumo que a política tomou, eu decidi que
precisava fazer alguma coisa e tirei meu título", diz Charatz. A
solicitação em ano eleitoral deve ocorrer até 151 dias antes do pleito —data
que, neste ano, se encerrou em 9 de maio. Em ano sem votação, o alistamento
pode ser feito em qualquer dia em um cartório eleitoral.
"Tirar o título foi uma iniciativa minha. Não quero
deixar as pessoas serem eleitas sem a minha participação", diz Charatz.
Segundo a estudante, suas ideias e percepções sobre política são formadas a
partir de assuntos que ela lê ou assiste na imprensa, principalmente online.
Charatz ainda não decidiu seu voto.
Em outra ponta da cidade, na zona sul, Vitória Beatriz da
Cruz Oliveira também está indecisa. Aluna da Escola Estadual Professor Alberto
Conte, a jovem de 17 anos, assim como Charatz, vai votar pela primeira vez por
vontade própria no dia 7 de outubro.
Neste ano, preocupada com o que diz ser "uma crise
muito grande no Brasil", resolveu tirar seu título para "ajudar a
mudar a situação". Oliveira é também aluna do Studium, curso
pré-vestibular voltado para jovens de baixa renda em Pinheiros, zona oeste da
capital paulista.
Vitória Beatriz da Cruz Oliveira, aluna da Escola Estadual
Professor Alberto Conte e do cursinho Studium, voltado para jovens de baixa
renda - Bruno Santos/Folhapress
Para Oliveira, a melhor maneira de se informar sobre seus
candidatos é vasculhando sites e redes sociais oficiais dos políticos. "E
também um pouco na imprensa, mas não tanto porque ela acaba manipulando muito”,
diz.
O interesse de adolescentes por votar pela primeira vez,
segundo especialistas ouvidos pela Folha, tem relação com a forte presença
de jovens em redes
sociais, ambiente em que candidatos divulgam sua propostas, repercutem
notícias e até fazem pronunciamentos em tempo real —as chamadas
"lives".
Outra questão apontada é a identificação de jovens com temas
de cunho social.
"Para o senso comum, vivemos um período de descrença
política, mas vemos engajamento dos jovens em coletivos, não em partidos,
identificados com temas como feminismo, questões LGBT e ambiental, por
exemplo", diz Marco Teixeira, professor e pesquisador do Departamento de
Gestão Pública da FGV.
"Temos uma grande onda global pelos direitos da mulher
que pega principalmente jovens, como o caso
do aborto na Argentina e o casoMarielle",
diz.
Segundo Álvaro Maimoni, consultor político e advogado da
Hold Assessoria Legislativa, também pesa sobre os adolescentes a intensificação
do debate político após o impeachment
de Dilma, em 2016.
"Movimentos como o Vem
Pra Rua e o MBL,
por exemplo, não existiam de uma forma tão ampla e tão aberta como agora. E
eles souberam utilizar as redes sociais como ninguém nunca fez", afirma
Maimoni, sobre os coletivos que surgiram na esteira dos protestos
de junho de 2013.
Para ele, jovens que hoje estão na faixa dos 16 anos
cresceram com o noticiário
envolto em corrupção em órgãos públicos. “Sempre escutaram coisas como
‘nós temos que acabar com a corrupção’ e compraram essa ideia”, diz.
A jovem Oliveira, entretanto, não vê interesse dos políticos
por essa faixa de eleitores. "Eles não esperam que os jovens votem. Se
parar para ver, eles não fazem planos diretamente para os jovens",
afirma.