EM ÁUDIOS, VEREADORES COBRAM REPASSE DE PROPINA: 'EU QUERO MEU NEGÓCIO. É OBRIGAÇÃO'
Escutas telefônicas feitas pela Polícia Civil revelaram como
funcionava o suposto
esquema de corrupção na Câmara de Vereadores de Augustinópolis, norte do
Tocantins. Os áudios mostram que a propina foi cobrada até na votação da Lei
Orçamentária Anual (LOA) e os vereadores ficavam irritados quando o repasse
atrasava. Segundo a polícia, o grupo de vereadores chegava a receber R$ 40 mil
por mês e a suspeita é de que houve um desvio de R$ 1,5 milhão em três anos.
Na manhã desta sexta-feira (25), sete vereadores foram presos
temporariamente e outros três são considerados foragidos. Ao todo, 10 dos 11
vereadores tinham mandados de prisão temporária. Apenas o presidente da casa
não teve ordem de prisão expedida pela Justiça.
Em um dos áudios, gravado no dia 18 de dezembro, o vereador
Antônio Feitosa diz que vai cobrar um extra para votar a LOA.
Secretário Paulo: Presidente, nós ainda tem sessão esse
ano? [sic]
Antônio Feitosa: Tem três, bicho. Deixa eu te falar: cadê a LOA, cadê a
LDO?
Secretário Paulo: Tá aqui. O menino vai entregar hoje [...]
Antônio Feitosa: Pode preparar um extra aí, viu?
Secretário Paulo: não, mas sim. Eu vou falar com o Júlio [prefeito] aqui.
Antônio Feitosa: Pode preparar para poder resolver lá.
Os áudios mostram que o codinome usado para a propina era
"documento" ou "documento do prefeito". Em outra gravação,
o secretário avisa o prefeito sobre a cobrança feita pelo vereador.
Secretário Paulo: E aí, tem uns documentos pro senhor
assinar também pra gente poder... Aí eu quero ver com o senhor como é que vai
fechar a conversa com os vereadores. Porque eu tô sentindo, chefe, que nós
vamos ter que pagar um extra aqui, viu?
Prefeito Júlio Oliveira: Não, hurum.
Os áudios mostram ainda que a demora no pagamento em
dezembro deixou os vereadores impacientes.
Ângela Maria: Tu conversou com o prefeito?
Antônio Feitosa: Moço, eu tô com dois dias ligando pra ele e nem chama o
telefone.
Ângela Maria: Rapaz, moço. Hoje é vinte e quatro. Os vereadores tudinho
precisando daquilo.
Ângela Maria: pois tu ver com prefeito se tem como ele antecipar pra hoje
o nosso?
Em um dos áudios, o presidente da Câmara de Vereadores,
Cícero Cruz Moutinho (PR), questiona a vereadora Ângela Maria Silva Araújo de
Oliveira (PSDB) sobre o pagamento da propina, que estaria sendo utilizado por
outro parlamentar para comprar apoio na votação para mesa diretora. Durante
entrevista à TV Anhanguera, o presidente disse que desconhecia o esquema.
Ângela Maria: Não, o nosso ainda é o mesmo valor. O
meu, né [inaudível]. O meu.
Cícero Moutinho: Não sabe o dos outros? Porque a covardia é grande, né?
Ângela Maria: É porque eu não pergunto, né presidente? Eu não vou lá: Ei
fulano, o prefeito te paga quanto? Eu não, não ando atrás disso aí não.
As gravações demonstram ainda que os vereadores recebiam a
propina há algum tempo e viam o pagamento como uma obrigação da prefeitura.
Ângela Maria: O prefeito... o Toin passou o documento
do prefeito?
Antônio Barbosa: Até agora não. E pra tu?
Ângela Maria: Humhum
Ângela Maria: Mas amanhã cedo eu vou ligar pra ele. Eu quero meu negócio.
É obrigação, não é dizer que não é obrigação não. [...]
Além de determinar a prisão de dez vereadores, a Justiça
determinou também o afastamento dos investigados por 180 dias. Com isso, os
suplentes devem ser nomeados imediatamente para ocupar os cargos. Apenas o
presidente da Câmara, que não está sendo investigado neste momento, continua no
cargo.
Entenda
A Justiça determinou a prisão
temporária de dez vereadores de Augustinópolis, na região norte do
Tocantins. A Polícia Civil cumpre os mandados na manhã desta sexta-feira (25).
Apenas o presidente da Câmara de Vereadores não teve a prisão decretada, mas
está sendo levado para depor. Ao todo, a cidade tem 11 vereadores. A operação foi
chamada de Perfídia e investiga a cobrança de propina para aprovar projetos
enviados pela prefeitura da cidade.
A operação foi chamada de Perfídia e está sendo realizada
pela Polícia Civil e Ministério Público. São 14 mandados de busca e apreensão,
dez de prisão temporária e três intimações para prestar depoimento. O prefeito
da cidade e o presidente da câmara não estão sendo investigados neste momento.
"Durante todo o monitoramento dos vereadores, em nenhum
momento foi ouvido falar em benefícios que seriam para a população de
Augustinópolis. Visavam apenas o locupletamento de dinheiro, extorquindo, de
certo modo, a prefeitura para pagar valores para que aprovassem projetos
oriundos da Prefeitura Municipal de Augustinópolis", comentou o delegado
Thyago Bustorff.
Até às 12h desta sexta-feira (25), apenas os vereadores
Wagner Uchôa (MDB), Edivan Neves da Conceição (MDB) e o Antônio Queiroz (PSB)
ainda não foram encontrados. Todos os demais mandados foram cumpridos. Os
parlamentares vão responder por corrupção passiva e associação criminosa.
Os mandados de prisão são contra os seguintes vereadores:
Maria Luisa de Jesus do Nascimento (PP)
Antônio Silva Feitosa (PTB)
Antônio Barbosa Sousa (SD)
Antônio José Queiroz dos Santos (PSB) - Foragido
Edvan Neves Conceição (MDB) - Foragido
Ozeas Gomes Teixeira (PR)
Francinildo Lopes Soares (PSDB)
Angela Maria Silva Araújo de Oliveira (PSDB)
Marcos Pereira de Alencar (PRB)
Wagner Mariano Uchôa Lima (MDB)
Outro lado
O advogado Fábio Alcântara, que representa Maria Luisa de
Jesus do Nascimento (PP) e Wagner Mariano Uchôa Lima (MDB), afirmou só vai se
posicionar após ter acesso aos autos do processo.
A advogada Cássia Cayres também informou que não teve acesso
ao processo e não pode se manifestar neste momento. Ela representa seis
vereadores: Ozeas Gomes Teixeira (PR), Francinildo Lopes Soares (PSDB), Antônio
Silva Feitosa (PTB), Angela Maria Silva Araújo de Oliveira (PSDB), Antônio
Barbosa Sousa (SD) e Edvan Neves Conceição (MDB).
G1