CELSO DE MELLO DEVE DECIDIR DESTINO DE LULA E MORO
Está nas mãos de Celso de Mello, do Supremo Tribunal
Federal, o destino do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, e
do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no julgamento do habeas corpus em
que o petista acusa o ex-juiz da Lava Jato de “parcialidade” e de agir com
“motivação política” ao condená-lo no caso do triplex. Na terça-feira, 25,
quando a Segunda Turma retomar o julgamento iniciado em dezembro do ano
passado, caso não haja surpresa, deve ser do decano da Corte o voto decisivo.
O relator da Operação Lava Jato no Supremo, ministro Edson
Fachin, e a ministra Cármen Lúcia já votaram contra o pedido de liberdade de
Lula. Faltam se posicionar os ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski,
além de Celso – os dois primeiros compõem a ala da Corte mais crítica aos
métodos da Lava Jato, além de serem os que menos concordam com o relator na
Turma. Dessa forma, não será surpreendente se eles votarem contra Moro.
Gilmar foi um dos poucos na Corte a condenar a troca de
mensagens atribuídas a Moro e a procuradores da Lava Jato publicadas pelo site
The Intercept Brasil. As conversas, segundo o site, sugerem que o então juiz
orientou investigações da operação. “Moro era o chefe da Lava Jato”, disse
Gilmar à revista Época.
Nos gabinetes, integrantes da Corte avaliam que o decano já
sinalizou que pode acompanhar a divergência que deve ser aberta por Gilmar para
tirar Lula da PF em Curitiba, onde está preso desde abril de 2018.
Essa não é a primeira vez que Celso de Mello analisa a
conduta de Moro. Em 2013, o ministro deu o único voto para que o então juiz
fosse declarado suspeito em caso de evasão de bilhões de reais do Banestado. À
época, Moro atuava na 2.ª Vara Federal de Curitiba, especializada em crimes de
lavagem de dinheiro.
A defesa do doleiro Rubens Catenacci, condenado por remessa
ilegal de divisas ao exterior, entrou com um habeas corpus no STF, alegando
suspeição de Moro nas investigações. Os advogados questionaram o monitoramento
de seus voos e o retardamento no cumprimento de uma ordem do Tribunal Regional
Federal da 4.ª Região.
Celso proferiu o voto para anular o processo, ao concluir
que Moro tinha violado o direito fundamental de que todo cidadão deve ser
julgado com imparcialidade. “Parece-me, em face do gravíssimo episódio do
monitoramento dos advogados do ora paciente, que teria ocorrido séria ofensa ao
dever de imparcialidade judicial”, disse.
Essas palavras foram lembradas agora pela defesa de Lula,
que enviou ao STF o conteúdo das mensagens atribuídas a Moro e ao coordenador
da força-tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol.
Método
Workaholic e centralizador, Celso elabora seu voto sozinho,
dispensando o apoio de juízes auxiliares. Isso compromete a velocidade com que
decide sobre os milhares de processos que estão no seu gabinete, frustrando
advogados que esperam respostas rápidas.
Faz parte da rotina do ministro entrar pela madrugada
escrevendo suas decisões e grifando palavras, regadas à música clássica –
Gustav Mahler, de preferência -, lanches do McDonald’s e Coca-Cola.
Em momentos de crise, é o decano que costuma ser o “bombeiro”
do tribunal. Recentemente, tornou-se o principal porta-voz do STF e da
liberdade de expressão – defendeu a atuação da Corte na criminalização da
homofobia e condenou a censura à revista digital Crusoé e ao site O
Antagonista.
Se a leitura de integrantes do Supremo estiver correta sobre
seu voto desta terça, que pode levar à liberdade de Lula, seria um ponto fora
da curva no histórico de decisões do decano envolvendo a Lava Jato e
desdobramentos da operação. É o que apontam as estatísticas.
O jornal O Estado de S. Paulo fez um levantamento das
votações nos casos mais importantes na Segunda Turma. São julgamentos sobre
recebimento de denúncias, arquivamento de inquéritos, prisão de investigados e
compartilhamento de delações, analisados desde que Cármen voltou a compor o
colegiado, em setembro do ano passado.
O balanço mostra que Celso acompanhou o entendimento de
Fachin em 75% das vezes. O decano é o segundo integrante que mais concorda com
o relator da Lava Jato, ficando atrás apenas de Cármen, que convergiu em 100%
dos julgamentos analisados pela reportagem.
Um ministro ouvido reservadamente pela reportagem teme que
Cármen “segure” o processo de Lula, já que cabe a ela, na condição de
presidente da turma, definir o que será julgado nas sessões. Esse magistrado
afirmou, no entanto, que o petista é réu preso, o que significa que o caso deve
ser tratado como prioridade na terça-feira.
“O ministro Celso de Mello é sereno e reservado. É um bom
ministro para ficar com o voto decisivo nesse julgamento, vai saber julgar os
fatos de acordo com a lei e a imparcialidade que se espera de um juiz”, disse a
professora de direito penal Heloísa Estellita, da FGV-SP, que já trabalhou no
Supremo.
No julgamento da criminalização da homofobia, Celso impôs a
autoridade da Corte para enfrentar o tema, apesar da resistência de
parlamentares evangélicos. “Sei que, em razão de meu voto e de minha conhecida
posição em defesa dos direitos das minorias, serei inevitavelmente incluído no
‘index’ mantido pelos cultores da intolerância”, disse ele ao iniciar o voto. O
placar foi de 8 a 3 pela criminalização.
Com a saúde debilitada, Celso se queixa de dor na região do
quadril e tem chegado às sessões plenárias de cadeira de rodas. Uma rampa foi
erguida perto do elevador para facilitar o deslocamento. Procurado pelo jornal
O Estado de S. Paulo, o decano não quis conceder entrevista.