FILHOS DE BOLSONARO NOMEARAM PRESIDENTE DO BNDES. E A FALA TORTA DO GENERAL
O engenheiro Gustavo Montezano, de 37 anos, com mestrado em
economia, foi nomeado presidente do BNDES. É um profissional de mercado
financeiro respeitado por aqueles de sua geração na área de crédito. Tem a
aprovação até de uma turma já mais madura. Mas apresenta currículo para
presidir o BNDES, o maior banco de fomento do gênero no mundo? A resposta
unânime é "não". Vai dar certo? Não sei. Chegou lá por maus
propósitos. Vai abraçá-los? A ver.
Uma coisa é certa: ele aceita cumprir "missões"
meramente políticas num cargo técnico. E uma das que lhe foram atribuídas é
levar adiante a caça às bruxas em gestões passadas no banco, muito
especialmente a petista. Mais ainda: há um fato que está sendo subestimado no
noticiário: trata-se de uma indicação não de Salim Mattar, secretário de
Desestatização, de quem era segundo. Também não é uma escolha de Paulo Guedes,
ministro da Economia.
FALA TORTA DE RÊGO BARROS
Quem nomeou Montezano foram os filhos de Jair Bolsonaro. A amizade vem ali da
pós-infância, da primeiríssima juventude. Ou por outra: teremos, sim, um BNDES
com viés ideológico. Os filhos o escolheram para ser o segundo de Mattar, e
dali ele pulou para o BNDES. É tecnicamente ruim? Depende para quê. Já chego
lá. Atenho-me antes à fala do general Rêgo Barros, porta-voz de Bolsonaro.
Prestem atenção:
"O presidente tem, por concepção pessoal, naturalmente, a percepção de que
eventuais pessoas que tenham participado de governos que colocaram o Brasil
nessa situação catastrófica em que se encontra não devem compartir conosco a
possibilidade de promover a melhoria do Brasil. É nesse contexto que o
presidente trabalha. Por outra vertente, a escolha das pessoas que hão de
dirigir os vários órgãos do governo do presidente Bolsonaro é nitidamente, e
vocês já perceberam isso, dentro de um caráter técnico. Então, sendo um caráter
técnico, o próprio substituto do Joaquim Levy, agora se apresentando, Gustavo
Montezano, corrobora essa percepção do senhor presidente."
Há vários problemas na declaração de Rêgo Barros. Um deles é
o próprio Régo Barros, um general de divisão da ativa. Quando ele usa a
primeira pessoa do plural, como em "conosco", não se sabe se fala
apenas do governo ou também das Forças Armadas. Em segundo lugar, mas não menos
importante, cumpre destacar: Joaquim Levy já era Joaquim Levy quando foi
escolhido para o comando do banco. Tinha servido à primeira gestão Lula como
secretário do Tesouro (2002 a 2006) e ao primeiro governo Sérgio Cabral como
secretário da Fazenda (2007-2010). Não colaborou com catástrofe nenhuma nem num
caso nem noutro.
LEVY E O FUZILAMENTO DE FHC
No governo FHC, foi secretário-adjunto de Política Econômica do Ministério da
Fazenda; em 2001, economista-chefe do Ministério do Planejamento, Orçamento e
Gestão. Eram tempos em que Bolsonaro defendia o fuzilamento do então presidente
em razão das privatizações. Quem, afinal, queria destruir o Brasil então? É
professor de Economia, já trabalhou do FMI, no Baco Interamericano de
Desenvolvimento e no Banco Mundial.
Meter Levy no saco de gatos pardos de pessoas que
"participaram de governos que colocaram o Brasil numa situação
catastrófica" é, antes de mais nada, uma mentira. Além de ser, obviamente,
um desrespeito. Desrespeito que se estende a Marcos Barbosa Pinto, que havia
sido escolhido por Levy para assumir a diretoria de Mercado de Capitais do
banco.
ALGUNS "NOMES TÉCNICOS" DE BOLSONARO
A propósito, encaixam-se no critério de competência técnica, alardeado pelo
porta-voz, os ministros Abraham Weintraub, da Educação; Ernesto Araújo, das
Relações Exteriores; Damares Alves, das Mulheres, Família e Direitos Humanos;
Ricardo Salles, do Meio Ambiente? Em todos esses casos, o chamado "viés
ideológico" precede a competência e a experiência. Certamente a iniciativa
privada de alta performance não os contrataria para um cargo de comando, não é
mesmo?, como o Bradesco já contratou Levy. Então vamos com calma! Um pouco mais
de respeito com a biografia alheia.
Tomara que Montezano se dê bem no cargo. O começo é torto. É
visto pelo mercado como um bom analista de crédito. Talvez não haja quadro no
BNDES com a sua expertise nessa área. Mas também há vozes graduadas que o
consideram politicamente ingênuo. E aí sempre mora o perigo em área tão
delicada. Certamente está calçando um sapato que, em princípio, é muito maior
do que o seu pé. "Sapato não encolhe, e pé não cresce depois de certa
idade, Reinaldo". Sim, é verdade. Estamos no terreno da metáfora, não é?,
do simbolismo. Se assumir o cargo para ter um desempenho técnico, como promete
o porta-voz, o pé pode expandir-se para a adequar-se ao sapato. Mas ele pode
fazer o contrário, forçando o calçado a adaptar-se a seu tamanho. Aí os
brasileiros é que vão pagar o pato pelas amizades dos filhos presidente de
turno.