OUÇA ÁUDIOS DE PREFEITO DE NATAL E EMPRESÁRIOS EM REUNIÃO EM QUE SUGEREM ASSÉDIO ELEITORAL CONTRA EMPREGADOS PARA VOTAR EM BOLSONARO
A gravação do áudio original tem duração de 51 minutos e 30 segundos, e foi iniciada minutos depois do começo da reunião. Entre os empresários presentes, estavam Caio Fernandes, Gladstone Heronildes (King’s Flat Hotel) e Matheus Feitosa, presidente da Associação dos Empresários do Bairro do Alecrim (AEBA); outros nomes citados — que a reportagem não conseguiu confirmar a identidade, foram “Jorge”, gerente de uma empresa na zona Norte, e “Silvio”.
A reunião aconteceu durante o horário de expediente da Prefeitura do Natal e também recebeu integrantes do primeiro escalão do governo Álvaro Dias, como o secretário de turismo Fernando Fernandes, o vereador Kleber Fernandes (PSDB) e o Coronel Hélio Oliveira. Na plateia, dentre outros, o secretário de infraestrutura, Carlson Gomes.
O caso ganhou repercussão a partir da divulgação do teor das conversas, e Álvaro Dias deve ser investigado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) por possível assédio moral. Nesta sexta (21), o vereador de Natal, Robério Paulino (PSOL), e a deputada federal Natália Bonavides (PT), protocolaram duas ações no MPT contra o prefeito.
Álvaro Dias não ficou no encontro até o final. Ele saiu em viagem para Caicó, onde participaria de um encontro com lideranças da região Seridó em apoio a Bolsonaro. A única fala presente nestes trechos que ele ouviu foi a de “Jorge”.
OUÇA:
Álvaro Dias, prefeito de Natal
“É como eu disse na eleição para Senado ainda. Começou a eleição pro Senado, Carlos Eduardo tinha 37%. Rogério Marinho, 17. A diferença pra Carlos Eduardo aqui era 60 mil votos [que] Rogério perdia na cidade de Natal. Começou a eleição, eu recebi a pesquisa, olhamos e tal, e as pessoas ficaram preocupadas dizendo: ‘olha, isso aqui pode definir a eleição’. E a gente assumiu a campanha de Rogério dizendo o seguinte. Eu disse aqui em Natal, nas reuniões com secretários, com cargos de confiança, nas reuniões nos bairros, nos comícios onde eu fui, eu disse: ‘olha, o candidato não é Rogério Marinho. O candidato a senador aqui em Natal sou eu. Vocês vão votar não em Rogério, vão votar no prefeito da cidade. Vocês me ajudem, porque Álvaro Dias no Senado Federal, Natal tem muito a lucrar com isso, a avançar, caminhar em direção ao futuro. Realmente esse discurso funcionou, porque a maioria que era de 160 mil votos, terminou em minguados 2 ou 3 mil votos, uma eleição empatada e eu até diria vitoriosa para Rogério Marinho aqui em Natal”.
Matheus Feitosa, presidente da Associação dos Empresários do Bairro do Alecrim (AEBA)
“Inclusive hoje a Tribuna publicou a informação que é um absurdo, sobre terrenos privados e terrenos do governo. A gente tem que compartilhar essas informações com nossos colaboradores, com nossos funcionários da nossa residência, com quem for. Nossos familiares que ainda estão indecisos ou que dizem que vão votar em Lula. Isso é um absurdo que a gente não pode aceitar que aconteça na próxima gestão. Então a gente tem que unir forças, como o prefeito disse aqui, os secretários, coronel Hélio. Muitas vezes a gente já deu voltas no bairro do Alecrim, com General Girão também, para convencer os empresários a conversarem com suas equipes. A gente sabe que tem muito medo também de sofrer retaliações na mídia, de ter uma foto, um vídeo gravado por aquele colaborador que é do outro lado, que é petista, mas a gente tem que ver uma forma de conversar com essas pessoas, de tentar convencê-los, de sempre pegar matérias interessantes, de credibilidade, que a gente possa compartilhar nos nossos grupos de WhatsApp. Ou pegar aquela matéria de um recorte do jornal e botar ali no mural da empresa para que aquelas pessoas sintam o impacto dessa realidade na empresa, no seu emprego, na sua realidade de amanhã de colocar a comida na mesa”.
Gladstone Heronildes, advogado e representante do King’s Flat Hotel
“Nós estamos vendo a manipulação não só de pessoas até esclarecidas, que são, meu amigo aqui que é da hotelaria também, estão sucumbindo pelo engodo dessa ideia de socialismo que só traz fracasso, derrota e subdesenvolvimento para sociedade em qualquer lugar onde um dia esteve no governo e na direção de qualquer nação. Todos nós sabemos disso. E é importante que o empresariado de fato que forma opinião. Nós não podemos chegar dentro da empresa, porque os sindicatos são também petistas, socialistas e comunistas. Como também às vezes até o Ministério Público do Trabalho, e nós corremos o risco de por mero esclarecimento sofrer sanção dentro da empresa, se a gente convencer ou ousar esclarecer”.
“Eu me lembro… quando a gente tá em Salvador, onde tem muito voto para o PT, no tempo que a maioria da população brasileira era analfabeta, a Igreja para ensinar o Evangelho ela fazia nos tetos das Igrejas, os desenhos das mensagens de vários textos da Bíblia. Porque só assim o ser humano mais humilde, de baixo nível de escolaridade, é que compreende aquela mensagem. E nós precisamos ir para esses setores da sociedade onde há maior carência, onde estão ainda enganados achando que Lula seria o pai para salvá-los da pobreza, de que, países que estão governados por outros Lulas, bem perto de nós, têm uma realidade ainda muito mais gravosa e avassaladora para a vida do cidadão, do que poderia estar aqui no Brasil, apesar de guerra, apesar de petróleo alto, apesar de uma série de problemas que nós tivemos no mundo. É preciso que um vídeo desse, viu Kléber, meu amigo [inaudível], querido. Eu não sei se vai ser cassado pelo TSE, mas às vezes o verbo, o vernáculo, a concatenação das ideias que nós produzimos nas palavras, não entra na cabeça do sujeito mais humilde de uma forma tão clara. É preciso que mostre para eles um vídeo como esse que mostre o povo comendo cachorro na Venezuela. O povo sucumbindo a uma ditadura sem liberdade como nós já estamos começando a vivenciar, e poderá piorar seguramente”.
“Jorge”, gerente de uma empresa na zona Norte
“É a primeira vez que venho para uma reunião política, não sou político. Agradecer ao prefeito e dizer que ele é um homem maravilhoso, porque ele atacou a Covid com o tratamento precoce. E fez uma coisa que ajudou muitas e muitas pessoas. Eu trabalho na zona Norte, sou gerente de uma empresa. Eu sou um bolsonarista atuante. Eu sou bolsonarista não, eu sou um direita, ou um de direita atuante, e nessa reta final, eu não tô nem dormindo mais, porque gente, parece uma piada [aplausos e trecho inaudível]. Não é brincadeira não. Muitos estão dizendo ‘eu tô ajudando, eu tô falando com minha mãe, tô falando com meu pai. Vai adiantar de nada. A gente tem que ir atrás de voto. A gente tem que facilitar as vidas das pessoas, para irem e virem. A gente tem que arrumar a condução. A gente tem que arrumar. Tem que convencer, tem que fazer tudo. Ontem um amigo meu disse: ‘rapaz, você vai ser preso’. Eu disse: ‘se for para ser preso brigando pela minha liberdade e do meu filho, eu vou ser preso. Depois que perder a liberdade, não tem mais o que reclamar não. A gente tá na reta final. Sabe o que é reta final? É reta de partir pra cima. Deixar de se acovardar. Eu disse: ‘olha, se for pra ser preso eu vou ser preso com alegria, e sei que vai ter gente que vai me soltar, viu Hélio”.
“Meu diretor ajudou financeiramente Rogério Marinho na campanha dele, como ele sempre fez para várias pessoas, vários políticos. Garibaldi, Agripino, e várias pessoas no passado. Sempre ajudou, sempre foi de forma lícita. E pegaram o nome dele, sacudiram lá dizendo que ele é apoiador de arma, de num sei o quê. Ele tá indignado. Ele nunca pegou em arma e nunca incentivou ninguém a falar de arma. Eu me indigno e passei minha indignação para todos os meus colaboradores, 400 colaboradores. Ontem eu dei seis palestras dentro da minha empresa falando que saiu o nome do meu diretor sobre o negócio que foi feito a distorção das informações”.
Empresário não identificado
“Eu tirei um mês e meio da atenção da minha empresa, e 15 dias eu saí totalmente da minha empresa, e me mudei praticamente pra São Miguel do Gostoso. Como eu já tinha passado um ano de pandemia lá, foi fácil. Deu até vontade de ficar mais. E fui. Fui na rua, conversei com pobre, fui aos 27 distritos, bati nas portas, conversei com as pessoas. Por que sabe o que a gente tem aqui nesse auditório? Alguém disse ‘é uma pena que nós temos poucos’. Não, eu acho que o que a gente tem aqui é qualidade. Nem sempre a quantidade é importante. O importante é qualidade. Todo mundo aqui é empresário bem sucedido, todo mundo aqui é comerciante. E nós não chegamos onde chegamos sem saber vender, sem saber argumentar e sem saber conversar”.
“Mas o voto que a gente quer tá naquela mulher que foi sua babá, naquela pessoa que você conhece do interior. Porque a informação que a gente tem, esse carrilhão de informação que chega toda hora, que é difícil você, de um lado e do outro, é difícil você saber o que é fake e o que não é. Você tem que usar a cabeça para saber o que tá certo e o que não tá. Mas essa informação não chega ao povo do interior. O filho da **** do cara que administra no interior entrega um posto e diz que é ele que tá entregando. Faz um posto de saúde e diz que é ele que tá fazendo”.
Em reunião de Álvaro com empresários pró-Bolsonaro, faltam negros e mulheres e sobram ataques a pobres
A reunião organizada pelo prefeito de Natal, Álvaro Dias (PSDB), com empresários e administradores da capital potiguar nesta quinta (20) em apoio ao presidente Jair Bolsonaro (PL), durou pouco, mas rendeu críticas ao PT e tentativas de cooptação de empregados.
O encontro foi marcado para às 16h em um hotel localizado em Ponta Negra, zona Sul de Natal, e terminou por volta das 17h40. Mesmo com a popularidade de Dias, que conseguiu eleger Rogério Marinho (PL) como seu senador, não foi possível lotar todas as cadeiras do auditório. Cerca de 30% dos assentos estavam disponíveis, e quem chegava atrasado ainda conseguia se sentar à frente, próximo da mesa de oradores onde o prefeito estava.
Outra “etnografia” sentida foi a pouca presença de mulheres e pessoas pretas. Mulheres, ainda havia algumas. Já entre os pretos, nenhum. A maioria dos participantes eram brancos, empresários de setores como construção civil, hotelaria e gastronomia.
Ao longo do evento, foram pelo menos oito discursos ao microfone, todos de homens e exaltando o presidente Jair Bolsonaro. Até o primeiro escalão estava presente. O secretário de turismo Fernando Fernandes estava ao lado de Álvaro. Já discreto, sem querer aparecer, Carlos Gomes, titular da secretaria de infraestrutura, ficou sentado na parte de atrás, sob olhar de poucas pessoas.
As falas misturaram tons moderados a discursos inflamados, característicos dos seguidores mais radicais do presidente. Dias, por exemplo, estava contido, elencando feitos próprios e parcerias com o Governo Federal em um momento para se autopromover. Sobre o que o levou a apoiar a atual gestão, apontou: “o sentimento de esperança, de confiança e de otimismo em relação ao futuro.”
Uma surpresa no evento foi a presença do vereador tucano Kleber Fernandes. Durante a campanha eleitoral, ele não fez acenos ao presidente, ao menos publicamente. Nas suas redes sociais, declarou apoio apenas ao filho do prefeito, Adjuto Dias, para deputado estadual; o presidente da Câmara Municipal Paulinho Freire para federal; Marinho para senador e Fábio Dantas governador. Sobre a sucessão presidencial, não revelou voto.
Mesmo nas redes sociais, a postura de não declarar voto a Bolsonaro está mantida até agora. No encontro com empresários, entretanto, Kleber demonstrou apoio ao atual presidente e foi responsável por apresentar a agenda bolsonarista nos próximos dias em Natal, num indicativo de que está dentro da coordenação da campanha na capital.
Fernandes, inclusive, apresentou efusivamente uma novidade pouco anunciada até então: a vinda do vereador de Belo Horizonte-MG e deputado federal eleito Nikolas Ferreira (PL) a Natal, neste domingo (23). Ferreira se projetou como uma voz potente e popular do bolsonarismo, sendo um fenômeno eleitoral em Minas Gerais apesar de também propagar notícias falsas.
Nesta quinta (20), por exemplo, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ordenou que redes sociais apaguem um vídeo do vereador em que ele ataca Luiz Inácio Lula da (PT), associando-o à criminalidade, ao uso de drogas por crianças e adolescentes e à censura das redes sociais. O bolsonarista também acusou o candidato petista de apoiar o aborto, o fechamento de igrejas e a perseguição aos cristãos, temas rejeitados e negados por Lula em uma carta escrita ao povo evangélico.“Ele realmente é um fenômeno. Quem ainda não conhece, pode acompanhar nas redes sociais”, afirmou Kléber.
Fonte Agência SAIBA MAIS